16.7.03

1981
pelos irmãos Q & W Monteirinho, de pasagem por Klosterpforte.

“Le cinéma substitue à nos regards un mode qui s’accorde à nos désirs”
André Bazin

Mil novecentos e oitenta e um. Portugal falhava, mais uma vez, a qualificação para a fase final de um Mundial de futebol. Nas míticas quartas feiras europeias, o Liverpool batia o Real Madrid na final da Taça dos Campeões, a UEFA ia para o Ipswich Town e, na saudosa Taça das Taças, o Dinamo de Tiblissi ganhava à rasca ao Jena, clube da terra das lentes Carl Zeiss. O mundo continuava, portanto, a girar sobre si mesmo como uma bola enviosada rematada por Tamagnini Néné (o avançado que nunca borrava o equipamento), melhor marcador do campeonato, ganho pelo Benfica. Em Londres, Carlos, príncipe de Gales, casa com Lady Diana Spencer na catedral de São Paulo, num desafio transmitido pela televisão para mais de 700 milhões de pessoas em todo o mundo; mundo que ficava em suspense com a bala disparada por John Hinckley, numa tentativa frustada de assassinato do actor Ronald Reagan, então presidente. De filmes pareceu o roubo dos únicos quadros de Picasso e Dalí existentes em Portugal e que deixaram de estar no museu do Caramulo, museu esse que provavelmente não terá sido visitado por Henry Fonda e Katherine Hepburn, vencedores dos Oscars de melhor actor e actriz pelo desempenho em A Casa do Lago. Momentos de Glória levou o melhor filme. Injustamente, dirão todos aqueles cinéfilos e futebolófilos que conseguem recordar 1981 como o grande e inolvidável ano em que viram uma obra colossal chamada Fuga Para A Vitória, realizada por um Alessandro Altobelli da Sétima Arte, John Huston (We have a proublem).
Fuga para a Vitória tem uma história extremamente simples e básica. Tão simples e básica que dela apenas nos lembramos de se tratar de um grupo de presos Aliados que defronta, ante o olhar atento de Max Von Sydow (um nome que qualquer um de nós gostaria de ter, caso fosse futebolista), a temível Manshaft Nazi. Não há sexo, não há grandes tiros, apenas um braço partido de propósito. Como se chega a esse desafio de futebol, também não interessa. Nada mais importa nesse filme senão os derradeiros minutos em que o futebol é filmado com mestria e rigor para um miúdo dos seis aos noventa e seis anos. Aliás, cada vez que se revê este clássico, deve ir-se de imediato, sob pena de não aguentarmos o filme até ao fim, para a parte do jogo que, sim é verdade, deveria ser bem mais longa.
Se parte do elenco de actores se pudesse equiparar aos artistas que espalham na verde grama as finas linhas com que se cose a filigrana futebolística, diríamos que Fuga Para a Vitória congrega em si um Platini da sétima arte, Michael Caine, que contracena com uma mistura genética bem explosiva de um Stig Tofting com Fernando Aguiar, de um Jorge Cadete com um Tony Meola, de um Carlos Costa com um Idalécio: Silvester Stallone.
O desempenho de Stallone, como não podia deixar de ser, dá cabo do filme; quer com o seu riso descaído para o lado direito, quer e pelo ar de desilusão que carrega durante todo o filme pelo facto de não ter podido limpar o sebo aos avançados alemães com dois zagalotes ou duas rajadas de kalashnikov. Resolver-se-ia a questão com simplicidade, ganhando o jogo via técnica da força. Michael Caine, pelo seu lado, empresta ao futebol a sua (dele) arte de bem representar e meia dúzia de quilos feitos de banhas inesquecíveis. Aos actores da bola, juntam-se os futebolistas das telas: Osvaldo “Ossie” Ardilles, que com uma jogada em que faz a bola passar em forma de U invertido por cima do seu corpo e do corpo de um adversário, num exímio "gesto técnico", influenciou toda uma geração para a prática não das artes dramáticas, mas do futebol que acabava em drama (nas escolas, quem ousava – e conseguia – fazer esta jogada era, por via de regra, espancado pelo adversário humilhado); também lá andam Bobby Moore, Mike Summerbee e sobretudo Pelé, que, com as costelas partidas, marca um descomunal golo de bicicleta visto e revisto até a fita do video Beta ficar estragada.
Mas o momento mais intenso, o happy ending melhor que o beijo entre os amantes que se encontram depois anos de injustas ausências, melhor que o regresso a casa do soldado desconhecido, melhor que o morto certo que se salva no limite, é mesmo Stalonne a defender o penalty (injustamente assinalado, se bem que não é nosso apanágio comentar arbitragens) que vai ser marcado pelo pérfido e hediondo Baumann. Esta sequência chega aos cinco minutos, numa sucessão de planos intensos: olhos nos olhos, o suor que respinga pelo rosto, tensão, silêncio, balanço, angústia do guarda redes, Baumann vai rematar, Stalonne parte num vôo extenso, a sua boca abre-se e de lá sai um grito mudo, a bola percorre os onze metros, Stalonne continua a voar e... e... e... e... e... defende!!!De-fen-de!!! Sim, Yes, Oui, Da!!!! É o delírio nas bancadas do Estádio Colombes, senhores ouvintes e cinéfilos. Vê-se e revê-se a defesa em várias repetições em câmara hiper lenta, levanta-se da bancada e grita-se ao som da melodia encantatória de Bill Conti. Afinal, o cinema é isto mesmo. Para a posteridade, e porque assim cantava Espadinha (also gesungen kleineklinge), Recordar é Viver, aqui ficam os onzes iniciais daquele filmebol épico. O resultado? Um não menos clássico "empate com sabor a vitória" 4-4.


Aliados com:
1. Robert Hatch (USA) (SYLVESTER STALONE)
2. Michael Fileu (Bel) (PAUL VAN HIMST)
3. Cptn John COLBY (UK) (MICHAEL CAINE)
4. Pieter Van Beck (Hol) (CO PRINS)
5. Doug Clure (UK) - (RUSSELL OSMAN)
6. Terry Brady (UK) (BOBBY MOORE)
7. Arthur Hayes (Sco) (JOHN WARK)
8. Carlos Rey (Arg) (OSSIE ARDILES)
9. Sid Harmor (UK) (MIKE SUMERBEE)
10. Luis Fernandez (Bra) (PELE)
11. Erik Borge (Dinamarca) (SOREN LINDSTED)

subtituições
Arthur Hayes(Sco) (JOHN WARK) deu lugar a Paul Wolchek (Pol) (KAZIMARIEZ DEYNA) e Pieter Van Beck (Hol) (CO PRINS) a Gunnar Hilsson (Nor)(HALLVAR THORESEN)
Alemanha

1. Schmidt (Laurie Sivell)
2. Kuntz I
3. Reinhard
4. Baumann (Werner Roth)
5. Kuntz II
6. Kuntz III
7. Becker
8. Kuntz IV
9.General Bronte
10. Schmidt (Robin Turner)
11. Albrecht Durer (o próprio /as himself)

15.7.03

TOWARDS AN IBERIAN LANGUAGE?
por Augusto Justo, filólogo

"Agradezco a imensa oportunidade de entreinar el Real Madrid. És una honra y una grande óportunidade del entreinar el Real porque se trata de una squadra con el maior palmarés do mundo del futebol y isto me inspira para corresponder als ojectibos deste clube. Quiero correspondier al confiança qél Madrid depositou nas minhas cálidades.”

Carlos Queirós, 25 de Junho de 2003

Com estas singelas palavras e apesar do pedido de desculpas por não falar em castelhano ou em português, Carlos Queirós inscreveu-se no panteão dos portugueses que, mal passam Vilar Formoso são assolados pelo síndroma de se crerem autenticos Camilos Josés Celas da língua de Don Jaime de Marichalar. É verdadeiramente impressionante o vento de Espanha – tido, proverbialmente, como “nem bom” – e os seus efeitos imediáticos na verborreia dos portugueses em geral e, em particular, dos portugueses afectos ao desporto rei (ou presidente, caso a costela penda para o republicanismo). Passa-se Elvas e já se diz “por fabor, entchame lo depósito con nobenta y oicho sin tchumbo”.
Na sua apresentação como “entrenador” do Real, Carlos Queirós terá, segundo estudos linguísticos recentes, dado um decisivo passo na sedimentação do portunhol e na criação de uma nova linguagem trans ibérica, já a piscar o olho a um esperanto latino: com o uso da palavra "squadra", em vez de equipo ou equipa, o Professor lança-se ferozmente à inclusão de italianismos neste novo vocabulário, humilhando, desta forma, correntes mais redutivistas que pretendem restringir o crescimento do idioma apenas ao português e castelhano.
Todavia, a génese desta Ibéria linguística remonta a 1987, aquando da chegada de Paulo Futre a terras de Almodovar, Pedro. Uma semana depois de se instalar em Madrid, em entrevista ao Domingo “Deportivo”, já dizia que “estar aqui é bueno, pero las saudades apertam” ou o antológico “solo corto mi pelo no Montijo”. Actualmente, o arrastão fonético com que fala o português torna-o mais imperceptível que o Vasco Lourinho. Alguns anos mais tarde, ocorria um fenómeno ainda mais curioso – apenas compreensível num prisma patológico – Agostinho, então jovem promessa do Vitória de Guimarães, desatou a falar portunhol logo que soube que o Real Madrid C ou Q de quáquá lhe seguia as pisadas (graças ao olhar rapace do grande Manuel Barbosa). “Me vou a jugar el futbol para Espanha”, dizia ele ainda a caminho de Valença (sem i). Assinou contrato e o português desapareceu (no seu duplo sentido).
Luis Figo é outro dos case studies em análise. Apesar de mais recatado, o “muso” inspirador dos poemas de Manuel Alegre (que lhe dão um galo monumental, diga-se de passagem), não nega à partida uma ciência que desconhece – o ser português. Porém, é claramente notória a vontade interior, recalcada e oprimida por vinte e poucos anos de portugalidade, em castelhanizar-se, vontade essa bem audível no facto de começar todas as frases com um “pois” delongadíssimo, quase pungente, que soa claramente a “pués”. Relembremos, como música para nossos ouvidos, o seu discurso antes quando abriu tudo o que era vogal e dizia que “pués nós no somos os favoritos”. Um pouco como Queirós, só que ao contrário.
Devagar, devagarinho, o portunhol, o torrão de Alicante, a Cepsa, a Evax fina y segura, a Corporación Dermoestética, os nossos futebolistas e agentes conexos lá vão mostrando o grande engano do não menos grande Miguel Costas, emblemático vocalista dos Siniestro Total (ex Mari Cruz Soriano y los que afinan su piano) quando, nos obscuros bares de Vigo, promovia, em 84 o álbum “Menos mal que nos queda Portugal”. Pois. Parece que é ao contrário.

PRIMEIRA GRANDE CAMPANHA FUTEBLOG-TOTAL

Vencedores anunciados!!!

Com o prazo para concorrer a terminar na passada sexta feira, a primeira grande campanhã do FUTEBLOG TOTAL - "SIM AOS PREÇOS ALTOS DOS BILHETES NO FUTEBOL PORTUGUÊS" - foi considerada, pela Administração, um verdadeiro fiasco, com apenas 35 almas caridosas a participarem nesta (alessandro) iniciativa. Mas, sem mais demoras, vamos aos resultados:

Vencedor do Mp3 “Ana Maria” – Pedro Resendes, Paris, com a frase “Chulos!!!”
Vencedor do Mp3 “ La Partita di Palonne” – Rui Miguel Marques Baião – Amadora, com a frase “Preços altos porque sim!”



“ - Zé Nuno Azevedo, o Braga pode ser vítima da pressão do Futebol Clube do Porto?
- De maneira nenhuma, o Braga só pode ser vítima de si mesmo”
José Nuno Azevedo, Setembro de 1998

10.7.03

REFLEXÕES SOBRE O PÓS-MODERNISMO NO FUTEBOL:
Breve contributo para o estudo do caso português


Professor Quarlos Eirós*


Se perguntarmos a três ou nove pessoas o que significa o pós-modernismo no futebol, teremos três ou nove reacções diferentes, podendo muito bem uma delas ser um bacalhau à Gomes de Sá. O pós-modernismo é um termo demasiado académico, usado pela primeira na ciência inexacta do futebol para qualificar o futebol geométrico de Lobanovsky, produto da Velha Escola da União Soviética, onde pontificavam estetas como Belanov, Khiddiatouline, Blokhine e Dasaev. Qualquer livre pensador ou intelectual de bancada sabe o que é o pós modernismo, mas não o consegue explicar por palavras próprias, muito menos o usa em casa.
Na segunda metade do século XX, o futebol começa a responder às solicitações de uma crescente sociedade de consumo. O pós guerra trouxe a revolução tecnológica e a vitória do Uruguai no mundial de 1950, energia nuclear, Di Stefano, computadores, Gordon Banks, televisão, o trinco e outras conquistas, que entravam rapidamente na vida das pessoas e passavam a fazer parte de seu dia a dia. Da mesma forma que chegavam até nós, as novidades rapidamente eram superadas e descartadas. Tudo passou guiar-se pelo efémero, sobretudo a vida de um treinador. Era a sociedade de consumo e da chicotada psicológica que surgia, ávida por novos produtos e com sede de vitórias a qualquer custo. E o futebol, enquanto arte de massas, teria de posicionar-se perante esta nova postura da sociedade.
A partir dos anos 80, motivados pelas modificações culturais na sociedade e pelo fracasso de certas obras racionalistas como a Holanda de Rhinus Michels, o Benfica de Eriksson ou FC Porto de Pedroto, alguns treinadores em Portugal começaram a questionar alguns dos dogmas modernistas. Por que não abrir mão dos elementos de ataque? O que posso conhecer? Donde vimos e para onde vamos? Por que não tornar o futebol numa arte plástica? O que há de errado com a retranca? Quanto calça Karl Popper? Por que renegar Helenio Herrera e o seu catenaccio? Com estas perguntas, começava a nascer uma nova corrente futebolística, antagónica ao modernismo: o "pós-modernismo".
Na falta de um termo melhor, a expressão pós-modernismo tentava identificar tudo o que vinha para além do modernismo. Na realidade, é tarefa árdua definir o pós-modernismo, pois frequentemente o encontramos a beber inspiração em modelos técnico-tácticos ocidentais, mesmo até nos próprios modelos modernistas, apesar de o renegarem em muitos aspectos. Em Portugal, podemos considerar como primeiros sinais sérios de pós modernismo o metafórico “deixem-me sonhar” de José Torres, antecedido pela visita transcendental do Vizela à primeira divisão na época de 84 / 85. Um exemplo de cartilha é mesmo o célebre golo de Marcelo, ao serviço do Benfica já no ano de 1996, frente ao União de Leiria: um centro atabalhoado e confuso para a pequena área, e o golo de Marcelo, o astuto ponta de lança, é marcado de cabeça a menos de 10 centímetros do chão, ficando o avançado com a cal da linha de baliza marcada nos queixos e não sendo pontapeado no crâneo por mera felicidade. Esta opção por marcar golo do modo mais bizarro e feio possível, desafiou cinquenta anos de modernismo, deixando a comunidade científica deveras incomodada com tamanha ousadia.
O treinador Jorge Jesus, um dos principais protagonistas e teóricos do pós-modernismo, traçou um paralelo de características opostas entre o pós-modernismo e o modernismo.

Pós-modernismo/ Modernismo
Complexidade, contradição/ Simplificação
1-5-1-2-1 ou 5-4-1 double volante/ 4-2-4 ou 4-3-3
Inclusividade/ Exclusividade técnico-táctica
Retranca/ Espectáculo e golos
Vitalidade emaranhada; paio monumental/ Unidade óbvia, estilo Ajax


Fica claro no paralelo traçado por Jorge Jesus a intenção de se contrapor ao modernismo, preocupação que sempre partiu dos pós-modernistas. Em geral os modernistas continuaram a seguir suas regras, jogando ao ataque e ficando no máximo espantados com as obras pós-modernas italianas e das equipas de segundo plano de Portugal. Curioso é que os ditos grandes portugueses sempre se armaram nos jogos europeus, até à brilhante prestação do F.C. Porto na Taça UEFA deste ano, em pós-modernistas.
Embora de características efémeras, com jogos muitas vezes relacionados com cenários descartáveis (a chicotada psicológica), tácticas utilizadas com meros fins de sobrevivência durante longas e penosas jornadas, o pós-modernismo teve o mérito de sacudir o marasmo que assolava o futebol moderno nos anos 60 e 70. Parecia que tudo já havia sido inventado, todos os golos espectaculares marcados e que o que se fazia era simplesmente reproduzir soluções consagradas. Os pós-modernistas não tinham medo de introduzir elementos clássicos em seus projectos, como o comprovam os típicos passes em profundidade para o terceiro terço do terreno, explorando uma situação clássica de contra ataque, e, ao constatarem a sua posição de vantagem no marcador, de imediato e paradoxalmente recorrem à clássica charutada para atirar a bola para fora do estádio: misturas aparentemente absurdas, mas feitas com o intuito de instigar o espectador a questionar-se e a posicionar-se em torno do que acabara de observar, reagindo com aplausos ou vaias e arremesso de objectos para dentro do relvado. O pós-modernismo é intencionalmente polémico e, neste sentido, tem amplo êxito junto de um público sempre exigente como é o nosso.

*com Álcio Lopes Mota.

9.7.03

TRANSFERÊNCIAS ÉPICAS DO FUTEBOL PORTUGUÊS, tomo 1

pelos irmãos Q & W Monteirinho, na obscuridade.

Carlos Secretário no Real Madrid ou o Melhor Negócio da História do Futebol Português Aconteça o que Acontecer até ao Séc XXII

Iniciava-se a época de 1996/97 e os tablóides anunciavam a transferência do ano: Carlos Secretário, defesa direito do Futebol Clube do Porto e da Portugesiche Manschaaft, assina um contrato com o Real Madrid. De imediato, e dissipando quaisquer dúvidas que até então remanescessem, J.N. Pinto da Costa é elevado à categoria de génio do comércio. Um Alves dos Reis da década de noventa, um daqueles grandes senhores que conseguem vender a torre Eiffel a um endinheirado industrial do Vale do Ave, um Professor Moriarty à moda do Porto. Um sentimento de comiseração quase condolente para com a direcção do Real Madrid toma-nos o coração. E mais se nos parte o dito cujo músculo quando o speaker do Santiago Barnabeu anuncia, na apresentação da Plantilla Merengue, "el defensor que todos buscavan y solo Real lo consegió: Carlos Secretáááário". E a afficción merengue, se bem que meio estupefacta, delira. Porque tem de delirar, apesar de nas bancadas ser audível um "¿Pero quien és este tío, hombre?"
Nascido em 1970, na bela S. João da Madeira, Carlos Alberto Oliveira Secretário, sempre com aquela cara de "não sei o que é que se está a passar" debutou na época de 1990/1991 no Nacional Maior (numa expressão muito grata a Ribeiro Cristóvão), com as cores do Penafiel. Um pulinho no Famalicão, outro no Braga e ei-lo no F. C. Porto, a completar a asa direita com João Pinto. A retirada do Grande Capitão abre lugar ao jovem Carlos que, pé ante pé se consegue impor a tudo e a todos, conquistando, graças à sua regularidade, um lugar na equipa das Quinas. Dele disse Cândido Sarmento: "conjuga a requintada técnica de um Carlos Costa com a pujança física de um Rui Barros".
E é precisamente no final da época de 96 que se dá o grande engano por parte dos dirigentes madridistas. Não será difícil imaginar as gargalhadas de Pinto da Costa a ecoarem na Torre das Antas quando, via fax, vê uma proposta vinda do...Real Madrid. Um fax de resposta a perguntar se se tinham enganado no nome do jogador, se não era o lateral esquerdo ou o Domingos (um abraço à malta do café Domisports - Céus, que nome- em Leça), uma contra resposta a dizer, "si, es el lateral derecho, lo queremos" e as negociações que se iniciam. E aqui, sim, o Papa do Norte é elvado á categoria de Génio pela simples razão de ter conseguido subir a parada até 300.000 contos.
A imprensa de Espanha estava incrédula. Mas quem seria este português? Informações como estas são as únicas que ainda restam acessíveis, em sites obscuros de fãs da Liga Espanhola: "Jugador de 26 años e internacional absoluto por la selección portuguesa. Procede del Oporto y se desenvuelve por la banda derecha, tanto en la defensa como en el centro del campo. Su fichaje fue aconsejado por Capello tras su gran rendimiento en la Eurocopa 96. Ademas, su venida al Real Madrid supuso un golpe de efecto, ya que era uno de los grandes objetivos del actual técnico del Barcelona Bobby Robson. No ocupara plaza de extranjero, gracias a su condición de comunitario". De notar três factos nesta descrição: o primeiro, o facto de considerarem Secretário um internacional absoluto, estatuto que só adquiriria depois do atraso para o Acosta, que o catapultou para aqueles interlúdios de cenas ridículas de desporto que passam na têvê a 31 de Dezembro; o segundo, o facto da sua contratação ter sido aconselhada por Capello, o que constitui prova irrefutável da mediania deste treinador, comprovada, claro está, com a menção de "su gran rendimento en la Eurocopa" (o que nos faz concluir, igualmente, que Capello viu um Euro 96 bem diferente de todos nós); terceiro e último, o facto desta contratação ter sido um modo do Real Madrid "picar" o seu arqui rival, tal como o Benfica, ferido no orgulho com as idas de Pacheco e Paulo Sousa para Alvalade, ter "picado" o Sporting com a contratação de grandes e singráveis nomes como Amaral, Marinho e o irrequieto Porfírio, que marcam a historiografia recente do clube da luz.
Independentemente de vendettas, o que é certo é que a entrada de Carlos Secretário no clube merengue se deu pela porta grande: 27 jogos na primeira época e 12 na segunda foram mais que suficientes para Capello se aperceber da asneirada e resgatar o seu "protegido" Panucci para fazer as vezes do nosso Carlos Alberto. A tão grande concorrência acresce o lamentável incidente em que se viu encolvido, a meio de um jogo, quando um canídeo entrou em pleno relvado do Barnabéu: Secretário perseguiu o dito bicho até à sua (dele) exaustão, enquanto o jogo continuava indiferente à estoica acção do nosso lateral, o que provocou uma monumental vaia dos adeptos. Inesquecível e duro para Carlos, inesquecível e hilariante para aqueles que vêem os interlúdios de cenas ridículas de desporto que passam na têvê a 31 de Dezembro.
É de relembrar as palavras sábias de Joaquim Lucas Duro de Jesus "Quinito", quando treinou o FC Porto depois de Viena 87 quando, virado para o seu próprio plantel dizia " Eu não sei se os hei-de treinar ou se lhes hei-de pedir autógrafos". O mesmo terá passado, com as devidas adaptações, pela cabeça de Carlos Oliveira Secretário quando encontrou, no mesmo balneário, nomes como Chendo (um concorrente directo), Hierro, Sanchis, Buyo, Illgner, Cañizares, Alkorta, Roberto Carlos (sim, é verdade), Redondo, Raul, Suker, Mijatovic e muitos outros. Impressionante, a quantidade de estrelas que se equipavam ao lado do nosso Carlos.
Já os adeptos não poupavam críticas às heróicas, porém inglórias exibições de Carlos Alberto. Leiam-se os exemplos concludentes dos desabafos dos verdadeiros madridistas (excepção seja feita ao elogio de um compatriota)

"Secretario??? ¿Por que este hombre sigue jugando como titular dia tras dia? Su rendimiento esta siendo nefasto, a la vez que tapona la posible entrada de otros jugadores cuya aportacion al equipo seria, a poco, mucho mayor."

"Secretario???
Opino lo mismo que el de arriba. No digo más porque me da pena. Victor"

"Secretario
Hello,I am a GREAT fan Of Madrid.I feel that Secertario is a good player.(actually a very good player.)he just needs time to get used to life in spain. You will not feel the same next year. You will be saying "what a player he his (sic)".
antonio j vieira"

"Secretario
Creo que es un tuercebotas, gracias a él se han marchado jugadores muy buenos de la cantera, como por ejemplo Gómez, que lo podría haber hecho bastante mejor que este hombre. No sé para que nos hemos gastado 250 millones en este "jugador" y que luego se quede atemorizado en la banda, además, Capello se dió cuenta tarde y hemos tenido que fichar a Panucci (gran jugador, por cierto) a mitad de temporada y quedarnos con Secretario, por que ya no lo quiere nadie. R.Hernandez"

E o fim da gesta madridista do "Tuercebotas" chegou mesmo em Dezembro de 1997, um ano e meio depois da estreia, 39 jogos de camisola "blanca" ao peito. Carlos Alberto, talvez inadaptado à exigente e sempre stressante vida de Madrid e cedendo à sempre lusitana Saudade, regressa ao seu Porto de sempre, lugar de onde, quem sabe, nunca houvera saído. Estava escrito um dos momentos mais épicos da emigração portuguesa, depois de Linda de Suza.

Sucesso Total na campanha SIM AOS PREÇOS ALTOS DOS BILHETES NO FUTEBOL PORTUGUÊS!

É com enorme sentido de Estado que anunciamos que a primeira grande campanhã FUTEBLOG-TOTAL tem sido um estrondoso sucesso: em apenas um dia, mais que dezena e meia de ávidos leitores participaram com frases rebuscadíssimas, apoiando de corpo e alma esta iniciativa. E note-se que o FUTEBLOG-TOTAL nem sequer tem patrocínio nas camisolas. O prazo desta campanhã prolonga-se até à próxima sexta feira, dia 11. Não perca mais tempo e habilite-se a dois Mp3 inesquecíveis, para além da evidente publicação da frase/parágrafo/monografia na Secção Hall of Fame. Força nisso, meus bravos. Mail to futeblogtotal@mail2football.com


"Manietámos o Alverca" - José Romão

"Zola escreve na pauta verde as notas com que se compõe a sinfonia do Futebol" - Gabriel Alves

"Você viu-me a agredir alguém? Eu não agredi ninguém, ca***ho" - Paulinho Santos

" Tinha 19 anos e o Porto a meus pés! Um dia, cheguei a casa às quatro da manhã, olhei-me ao espelho e disse: Paulo, isto não pode continuar, isto não pode continuar! E foi assim que me tornei no melhor jogador de Futebol do Mundo" - Paulo Futre

" Perguntale si tiene un foguete metido en el culo" - Toni, para um dos seus pupilos no Ginde, via tradutor (cuja nacionalidade era espanhola)

8.7.03

PRIMEIRA GRANDE CAMPANHA FUTEBLOG-TOTAL

Inicia-se mais uma época futebolística, Marius "vou-trocar-de-número-para-afastar-de-vez-o-meu-triste-fado-e-voltar-a-ser-goleador" Niculae já tem consulta marcada com a Bruxa, Fernando Aguiar já encanta um Benfica sedento de outro grande registra, e o FUTEBLOG-TOTAL em parceria com a FUTEBLOG-TOTAL SAD (but true), lança aos seus ávidos leitores a primeira grande Campanhã, denominada "SIM AOS PREÇOS ALTOS DOS BILHETES NO FUTEBOL PORTUGUÊS". Quer-se, com isto, sensibilizar as mais altas instãncias para o perigo que significa equacionar a descida do preço dos bilhetes e travar esta tendência a todo o custo. Afinal, será que há preço que pague a qualidade de um Gil Vicente vs Rio Ave no esplêndido Adelino Ribeiro Novo? Há preço a pagar por uma cadeirada bem assente no árbitro gatuno?
Escrevam as vossas frases de apoio à manutenção ou mesmo aumento do preço dos bilhetes dos jogos da Primeira Positiva Liga Super Galp 98 sem Chumbo para futeblogtotal@mail2football.com e habilitem-se a ganhar Mp3 do Trio Odemira "Ana Maria" e da Rita Pavone "La Partita di Pallone".

REFLEXÃO DA SEMANA

Penafiel na Champions League?

António Luis Oliveira - versão 2.1 - sans moustache - regressou ao poder (palavra quase indissociável quando se fala dele, Oliveira). Desta feita, num gesto levíssimo de desinteresse no servir o Associativismo, o homem que encheu o ego aos portugueses com a brilhante campanha Japão-Coreia 2002, volta a mandar nalguma coisa. O Penafiel é o alvo de um projecto de três anos, que deverá culminar com a subida do clube à Primeira Positiva Liga Super Galp 98 sem Chumbo. Já o estamos a ver, contra o Leça, de novo com bigode e a treinar, abraçado a um suplente e a murmurar-lhe "ensina a esses lisboetas a jogar futebol e come lá este dentinho de alho para dar sorte". Com a naturalidade e clareza de processos que o caracterizam, vislumbramos, de igual modo, o seu Penafiel a jogar a pré eliminatória da Liga dos Campeões, com o emblemático hino a ecoar no não menos emblemático estádio 25 de Abril.
Nota: Este texto não pretende ser, em caso algum, nenhum assassínio multimédia, bloguista ou cibernáutico, nem sequer sob a forma tentada. Desde já nos descartamos desse tipo de criminalidade.

O FIM DE UM MITO

Pelo Conselheiro Augusto Justo


Uma das propriedades da ciência da História é o desvelar de um certo tipo de fenomenologia que até então se cria atribuida a fenómenos de origem sobrenatural, divina e/ou (lê-se Ibarra Ou) metafísica. Assim foi com Alexandre Herculano e a substituição de Nossa Senhora pela porrada massiva de Afonso Henriques, como causa decisiva da vitória dos Tugas na batalha de Ourique, a título meramente exemplificativo. Sendo a História feita de factos e da sua interpretação, é caso para dizer, com Fernand Braudel - um registra destas andanças - que "o homem é produto do seu tempo" (dele, homem) e que os ditos cujos factos se encarregam de fazer tombar figuras, regimes, mitos e treinadores de futebol. Tenha-se como exemplo o mito criado por Sousa Cintra, quando apresentou Careca à comunicação social no dealbar da década de noventa: "este vai sêre o nov'Eusébie, e vai triunfare no Sporteng". Uma época menos conseguida e o novo Eusébio deixava a sua magia no Famalicão. Quer-se com isto chegar à mais chocante notícia que abalou o panorama futebolístico neste início de época. ARTUR JORGE RAPOU O BIGODE. Com efeito, o treinador da Académica eliminou da sua face uma penugem que fez história no modo de ser treinador em Portugal e, porque não dizê-lo, na Europa. Sim, por via de regra, qualquer treinador que quisesse ganhar alguma personalidade, tinha um bigode a puxar à Artur Jorge (cfr. o adjunto do Rei Artur no PSG que tinha um bigode mais à Artur Jorge que o próprio, cfr as penugens de José Romão, de Manuel Correia, de Toni, de José Rachão, de Vítor Urbano e do próprio Agatão). Caiu, portanto, a bigodaça mais mítica deste cantinho à beira mar plantado, bigodaça essa talvez só comparável à do não menos emblemático jogador do Desportivo de Chaves e Sporting de Braga, António Borges. E com este gesto cai também um mito na medida em que se apaga ou pretende apagar da memória colectiva dos amantes da décima arte a imagem de um treinador ganhador. O A.J. campeão europeu, português e de França será sempre o A.J. de bigode forte, farfalhudo e arqueado no sentido nariz-boca. O A.J. dos aflitos, do "aguenta-te Briosa" será uma figura estilisticamente diferente dessa: mais despida, mais exposta, mais rapada, menos triunfal. Aliás, pode afirmar-se com propriedade que existe um nexo de causalidade entre os Grandes Êxitos e Triunfos do Futebol Português (salvo a mais recente conquista do Futebol Clube do Porto) e a existência de bigodes dos seus timoneiros. Senão, vejamos: Inglaterra 66, o bigode de Otto Glória; França 84 o bigode do Chalana (valeu por todos e a selecção tinha quatro treinadores); Estugarda 85 e o mítico bigode de Carlão, a Locomotiva do Barreiro e México 86 com o bigode de sonho do Torres; Porto campeão europeu e o bigode agora desaparecido; Arábia 89 e Portugal 91, o bigode Shaolin do Professor Queirós; Euro 96 e o bigode do António Oliveira; Euro 2000 e o bigode de Humberto Coelho (que o cortou no início da prova; porém, a fase de qualificação foi feita de bigode); Japão/Coreia 2002 e o bis do bigode de Oliveira; Uefa 2002, sob o estigma do bigode de Reinaldo Teles, um irredutível bigodês. Mas deste nexo bigodal na selecção nacional e não só, falarei em lugar próprio...
Regressando ao fim do mito em análise, pessoalmente, sou forçado a confessar sem reservas: sempre pensei que, por baixo do bigode de Artur Jorge se encontrasse o nada, o vácuo, o vazio, a explicação de muitas das nossas dúvidas cósmicas. Mas não. Existe uma cara bem humana como a nossa e a do leitor. Apenas compreendo este gesto ao abrigo de uma frase do próprio autor de medonha mutilação: "temos de fazer coisas bonitas", deixando de lado a subjectividade inerente ao conceito de "bonito". Sempre pensei igualmente que Artur Jorge nunca, jamais e em tempo algum raparia o bigode, como penso, convictamente, que Agostinho Oliveira (outro de bigode) jamais terá queda de cabelo, como creio que o Baggio não se irá desfazer daquele rabo de cavalo. Quando vi o rei Artur sem bigode, pensei nos gloriosos tempos da Taça dos Campeões Europeus e do sprint que A.J. fazia atrás do João Pinto para tocar no caneco, lembrei o saudoso Matra Racing e a sua galopada infernal com Jorge Plácido e Enzo Francescoli, lembrei os 4-1 apanhados pelo Benfica ante o demolidor Farense de Hajry e Punisic, lembrei os empates com a Arménia e quejandos para o Mundial 98 e o obrigado Monsieur Batta... enfim, (e não escondendo algum embargo na voz que dita estas palavras à minha secretária La Salette) lembrei-me sempre mais do bigode que do próprio corpo que o prendia.
Com este gesto - de uma coragem ao alcance de muito poucos (talvez apenas de Paulo Madeira, quando se desfez dos seus longos e neandertálicos cabelos), desaparece um pouco de nós e da nossa relação com o futebol português dos anos oitenta e noventa. Estou para ver e medir as consequências deste gesto, consequências que adivinho profundas ao nível estrutural do nosso futebol português.

7.7.03

BERLUSCONI & A PROLIFERAÇÃO DOS BÊS

Por Cândido Sarmento *

A imprensa desportiva tem como primeira página o pilar dos escândalos futebolísticos internacionais: Silvio Berlusconi, colocando em segundo plano as mediáticas manchetes que são um quase exclusivo de Beckham... -Atentem à proliferação dos "Bês": Berlusconi, Barroso, Bush, Blair,Bibi, Big Brother.. - O certo é que o número 10 da Squadra Azurra terá que ser mais uma vez criticado, pelo lance que protagonizou e que colocou a Itália em desvantagem, frente a uma Alemanha que cada vez mais se consolida como selecção sólida e de mérito indiscutível.
A jogada caricata, dá-se neste jogo de fase de apuramento para o Euro2004, que se jogou em Estrasburgo na passada quarta-feira, num estádio repleto de jornalistas confiantes de polémica e de um publico italiano desmoralizado e mais confiante em amuletos que nos jogadores.
A sorte não beneficiou a equipa italiana que saiu com a bola no minuto inicial, já que o rodopiar da moeda de 2 Euros (brilhante, por usar, e de coroa francesa) lançada pelo árbitro desse mesmo país, deu vantagem aos jogadores Alemães que optaram jogar atacando para Este, quando se sabia que a Oeste o sol brilhava de forma incomoda e pouco usual para aquela latitude. Simone atrasou como ditam as regras a bola para o seu companheiro Luca, a seu lado no grande círculo. Uma frente de 3 médios Alemães correu para este jogador num arranque temível, soltando urros ameaçadores, lembrando uma guerra tribal, ao mesmo tempo que demonstravam uma potência em corrida ao melhor estilo Carl Lewis em disparo para um salto em comprimento. Luca, incapaz de dissimular o medo, aflito e com o nervosismo a coordenar-lhe os pés, decidiu atrasar mais uma vez, colocando a bola nos pés de Berlusconi, que circulava algo perdido perto dos limites da sua grande área. Berlusconi cujo seu lugar na equipa foi comprado pelo seu próprio dinheiro, é um jogador a que todos evitam passar a bola, fazendo-o apenas em jogos amigáveis, ou se a Italia logra de vasta vantagem sobre o adversário. É escusado recordar que Il Cavaliere se tornou Seleccionador/Jogador da selecção Italiana, quando no passado 2001 injectou vários milhões das antigas Liras para a remodelação do desporto italiano, a troco destes dois lugares de destaque no futebol italiano. Este feito inédito, faz de Berlusconi um elemento tão extravagante como prejudicial para o futebol e para o desporto em geral.
O certo é que essa corrida despreocupada que realizava (qual jogador por programar do Match Day do Spectrum), ilustrava o quão inesperado era para o jogador que lhe fosse passada a bola nos minutos iniciais do jogo. Assim, ao deparar-se na posse do esférico, e com os germânicos ainda mais convictos rumo a si, Berlusconi concretizou o golo que prometeu quando assumiu o cargo de jogador, no entanto, na baliza errada. Tendo a intenção de cortar para canto, falha num primeiro intento a bola, o chuto no vazio provoca um desequilíbrio parcial do corpo do sessentão bronzeado, houve ainda tempo para um sorriso de descontracção,como dizendo "Tutto sotto controle!", e é então que a caneleira direita (e não a chuteira) acertam na bola, numa trajectória tão ilusória, que o guardião italiano, que corria para o jogador, apenas pôde confirmar que a extensão do seu braço era inferior à distancia à bola, e que esta já tinha entrado dentro do rectângulo que defendia.
Berlusconi que em nenhum momento se envergonhou, citou numa entrevista para a RAI que sugeriu ao árbitro que fosse recomeçada a partida argumentando não ter ouvido o apito inicial. Por outro lado, culpando os franceses, recomendou que se observasse nas imagens o mau estado do terreno, pieno di buchi ed elevazzione, coautores da trajectória da bola. Também se dirigiu ao guardião do AC Milan com desdém, e é já certo que Paolo Giovanni está proibido de pisar o San Siro (à semelhança do castigo, com outra escala, imposto ao coreano que não poderá voltar a pisar Itália).
A falta de água quente nos balneários ao intervalo levaram a que não se recomeçasse o jogo na segunda parte, tendo sido adiados os 45 minutos finais para a quarta-feira da próxima semana.
O jogo que ao encerrar a primeira parte se mantinha com o marcador a 1-0, foi um espectáculo polémico marcado pela ausência de teor futebolístico na verdadeira acepção do termo. As estrelas italianas escolhidas por Berlusconi, quase todas pertencentes ao AC Milan, equipa de que também é presidente (mas em que felizmente não joga), apareceram nervosas e condicionadas por terem em campo consigo, o seu próprio seleccionador e presidente. A equipa alemã também correspondeu com um péssimo futebol, talvez afectada pelos rumores que saíram no Die Futväalda semana passada, em que se referia que Berlusconi qual Padrinho, tinha encomendado represálias horrendas para os autores dos golos da equipa alemã, e nem mesmo um siciliano (autor destas declarações) com supostas ligações anteriores à mafia se achou capaz de executar tais atrocidades
em atletas de alta competição.
Certo é que ainda por explicar está a sabotagem ao aquecimento dos balneários, e se por um lado, no precipitado do momento, se levantaram dúvidas quanto à legitimidade em terminar a partida, por outro lado a possibilidade de uma sabotagem nas condutas de gás com vista a uma explosão do recinto foi razão suficiente para que todo o estádio fosse evacuado pelos gendarmes franceses (parece certo que o terrorismo terá chegado ao futebol).
As investigações decorrem enquanto que a generalidade das pessoas mais uma vez esquecerá em dias, este episódio controverso do quotidiano desportivo, apoiados por uns Media sempre dispostos a iludir com notícias sensacionalistas. Parece não haver armas para combater os que com mérito duvidoso se instalam no poder.

*Candido Sarmento é professor de natação no C.N. Raval em Barcelona,
escreve semanalmente no 'Mundo Deportivo'.

4.7.03

Caros Futebloguistas:
É com incomensurável orgulho que convosco partilho a primeira de muitas análises feitas pelo mítico Professor Quarlos Eirós, dedicada a uma temática sempre premente: os jogadores raçudos. Sem mais delongas, aí vai o tomo um.
Boa leitura,
Augusto Justo, Presidente da Futeblog-Total SAD.

JOGADORES RAÇUDOS, Tomo 1: JORGE PAULO CADETE REIS.

Pelo Professor Quarlos Eirós

Sempre gostei muito do Jorge Cadete. A começar pelo nome, Jorge. Depois, pelos cabelos: durante anos, o Jorge representou com excelência o corte de cabelo à "foda-se", ou seja, muito curto em cima, e grandote na traseira, de modo a cobrir o cachaço. Não fosse a minha calvice precoce e teria, certamente, deixado crescer o cabelo à Cadete. Outro pormenor que me se afigura fantástico no Cadete é o "riso à Rambo". Se repararem bem, o Cadete só se ri para um lado, não apresentando o natural riso aberto, tal e qual o grande Stalonne naquele clássico, Rocky não sei bem quantos. Naquele e em todos os outros, o Stalonne é um campeone. Bem, mas voltando ao Cadete pode-se afirmar, com alguma segurança, que foi um bom exemplo do jogador raçudo (enfatizar o "u", como o Gabriel Alves faz) por todos os clubes por onde passou, excepto o Estrela, o SL Benfica, o Celta de Vigo e o Brescia. O que nos reduz ao Setúbal (que não conta, porque o Jorge era um miúdo), o Sporting e o Celtic. Sobretudo, nestes dois últimos clubes, jogando com o seu cabelo típico que ondulava enquanto corria, e rindo para o lado cada vez que marcava um golo, o Cadete foi um avançado muito raçudo. Corria mais nos momentos em que festejava os golos dele e os autogolos do Beto do que durante um jogo inteiro. Ainda hoje, quando estou em Glasgow a tratar dos meus investimentos, os meus empregados vêm ter comigo e me perguntam pelo Cadete. Eu calo-os sempre com vinte libras. Todavia, um deles teve que receber tratamento hospitalar quando soube que o Cadete tinha estado no Big Brother. Não aguentou de tanta comoção.
A experiência diz-me que o Jorge Cadete daria um excelente treinador de futebol. A sua acção no programa televisivo é disso bom comprovativo: basta notar o líder nato, o gestor de massas que o JC é. Se não fosse ele, não tenho a mais pequena dúvida que o Big Brother acabava mal. Senhores dirigentes desportivos, Jorge Cadete é o treinador do Século XXI. Basta que deixe crescer o bigode.

"There's only one George Cadete
He puts the ball in the net;
He scores with ease,
He's portuguese,
Walking in George's Wonderland!"
Robert Burns, Séc XVIII

A ARTE DO FUTEBOL E O SEU EXPOENTE MÁXIMO: O CATENACCIO

Pelos obscuros irmãos Q. e W. Monteirinho

Vila Nova de Nascido a, 4 de Julho

Na ciência do futebol, inexacta, como é comummente aceite, existe um princípio denominado "princípio da vitória", que se divide em formulações categóricas. Uma delas é a formulação defensiva do dito princípio, que nos diz que " no futebol só ganha quem defende bem ". Esta formulação leva-nos directamente para o Catenaccio, a mítica táctica inventada pelo austríaco Karl Rappan e aperfeiçoada pelo não menos mítico Helenio Herrera (primo da Teresa Herrera) no seu Inter de Milão dos anos sessenta. O Catenaccio consiste na utilização da célebre táctica 1 guarda redes, 9 defesas e um ponta quieta, sempre à espera do contropiede, da charutada que acaba por ser um passe magistral. Ao fim e ao cabo, reflecte um pouco a nossa vida: os grandes paios são vistos como momentos de génio. E nós somos os primeiros a confirmar a nossa própria genialidade. "Se eu não gostar de mim, quem gostará?", disse alguém um dia num lindo anúncio de têvê. Quando me atiro às mulheres, faço-o usando o Catenaccio, faço-o na defensiva. Nada de espampanâncias. Quando vou à entrevista de emprego, jogo em Catenaccio... nada de aventuras. O que fazemos na vida reflecte-se no futebol e versa vice. Quem gosta da vida, gosta de sardinhas e futebol. Quem espera sempre alcança. Quem defende sempre ataca, o melhor ataque é a defesa, Roma e Pavia não se fizeram num dia, aço, aço, calhamaço... só ataco em catenaccio.
Uma dúvida fica por desvendar: porque não foram os portugueses a inventar o catenaccio? Afinal, e olhando para a psicologia deste nosso povo, talhado para o pessimismo crónico, seria fácil ver no futebol o reflexo da tão lusitana mentalidade ilustrada pelo exemplo que se segue " - Zé Manel, acabaram de te roubar três mil dos teus três mil e duzentos euros que tinhas no banco... - Deixa lá, Marcelino, PODIA TER SIDO PIOR." ou " - Atentado em Samora Correia faz dois mil mortos... - Foi uma desgraça, mas podia ser MUITO PIOR." Ser português sem ter inventado o catenaccio é como ser o Buzz Aldrin e não ter ido nem à Lua nem a Boticas.

3.7.03

O PRECÁRIO INGLÊS DOS JOVENS ESPANHÓIS
Pelo Senhor Engenheiro Augusto Justo, também ele Maçon.

Caros FuteBloguistas:

Começo as iniciativas discursísticas em torno do futebol com um manifesto em torno da apresentação do meu caro amigo David Beckham em Madrid, provocada por uma notícia descoberta em exaustiva revista de imprensa feita por mim.
Atentemos, então, no exemplo recortado do jornal A BOLA, edição de 3 de Julho de 2003:

«A apresentação de Beckham teve um momento sentimental(...). Foi então que, de surpresa, surgiu um jovem a correr na direcção de Beckham e saltar para os seus braços. O abraço prolongou-se e repetiu-se várias vezes, perante a admiração dos seguranças e do público. Alfonso pediu uma camisola a Beckham, que imediatamente satisfez o seu desejo. Beckham ajudou a radiante criança a vestir o troféu.
Alfonso viveu o dia mais feliz da sua vida e não terá pregado olho durante a noite. Cumpriu também ele um sonho, que planificou desde que saiu de casa acompanhado pelos pais até se tornar realidade. «Tentei entrar no campo mas era impossível. Os guardas não me deixavam. Então vi que havia um buraco na rede. Achei que podia passar por lá e, sem perder tempo e sem ninguém me ver, entrei no relvado. Beckham foi muito simpático comigo. Falava em inglês e eu não compreendia nada. Pediu uma camisola e ajudou-me a vesti-la. Foi maravilhoso, Creio que nunca mais esquecerei este dia»».

Pois bem: foi com enorme espanto, lástima e algum incómodo que descobri que os jovens de onze anos espanhóis não percebem, perdoem-me a expressão, la punta de um cuerno de inglês. A chegada de David Beckham ao país vizinho prova-o, tal como o prova esta intrigante notícia, precisamente quando o puto diz que Beckham lhe falava em inglês e a criança - oh, pobre criança -" não compreendia nada". Ora, tal incompreensão, para além de se tornar um sinal inequívoco de deficientes condições de aprendizagem de línguas estrangeiras por parte dos jovens espanhóis, demonstra claramente que um pirralho português faria muito melhor figura, como o comprovam as hipotéticas declarações caso o petiz tivesse nascido em Lisboa: " Tentei entrar no campo mas era impossível. Os guardas não me deixavam. Então, saquei de um pouco de Napalm, feito pelo meu primo Antunes e fiz um buraco na rede (sic). Achei que podia passar por lá e, sem perder tempo e sem ninguém me ver, adormeci um bófia com éter e ainda tive engenho para lhe gamar o cabeça de cristo de ouro que ele trazia ao peito. Beckham foi muito simpático comigo. Falava em inglês e eu disse-lhe " Fuck Off!!! Larga-me da mão ò maricôncio! Se não me dás a tua t-shirt, I'll blow your stomach with a knife I have right here, hidden in my trousers, man!". Pediu, de imediato, uma camisola e ajudou-me a vesti-la. Foi maravilhoso, o Beckham tava todo borrado de medo! Creio que nunca mais esquecerei este dia".
Bem, com the arrival do meu amigo Becks a Madrid, pode ser que os Alfonsos de Espanha melhorem substancialmente o seu (deles) inglês.


Pequena Nótula enviada pelos obscuros Irmãos Q. e W. Monteirinho

Naquela praça suja, acercou-se de mim um rapaz com uma bola. Virou-se para mim e disse: "ò meu, podes marcar-me um penalty?" eu não pestanejei, retorquindo de imediato "põe-te na baliza, ò meia leca". Na altura, eu tinha um petardo descomunal e uma voz poderosíssima, de fazer inveja ao Roberto Carlos. Concentrei-me. Na minha cabeça, o estádio inteiro clamava o meu nome. Olhei o puto nos olhos, tomei balanço e mandei um estoiro monumental. Quando dei por mim, o puto estava estendido no chão com dois dentes partidos e eu não estava em estádio nenhum. Lentamente, o rapaz levantou-se e perguntou-me " forque é fe me fizefte ifto?". A única coisa que lhe consegui dizer foi "puto, o futebol é ifto mefmo". A bola, essa, estava no fundo das redes. Ao chegar a casa, telefonei ao Dino Baggio para lhe contar o sucedido. Dino, homem de bom tom, não hesitou e aconselhou-me de imediato a fazer este blog e a mudar de gravata.
Q. e W. Monteirinho. Vladivostok, Julho de 2003

Augusto Justo - pensador e lateral esquerdo
Cândido Sarmento - professor de natação no CN Raval, Barcelona
Q & W Monteirinho (os Obscuros Irmãos) - Psicólogos
Quarlos Eirós - Professor

Quatro ou cinco Colossos de Rhodes do livre pensamento futebolístico pela primeira vez juntos e ao vivo num concerto memorável. AS GRANDES DÚVIDAS EXISTÊNCIAIS DESTA CIÊNCIA INEXACTA DISCUTIDAS E COMENTADAS ONLINE POR ESPECIALISTAS NA MATÉRIA. Drama, suspense, acção, microeconomia, sexo, física quântica, comédia, revista à portuguesa, direito das obrigações, ESTÁ CÁ TUDO.


"Art is not there to provide knowledge in direct ways. It produces deepened perceptions of experience." - Joseph Beuys

"O Futebol é a coisa mais importante das coisas menos importantes das nossas vidas" - Paulo Autuori

"Manietámos o Alverca" - José Romão

"Zola escreve na pauta verde as notas com que se compõe a sinfonia do Futebol" - Gabriel Alves

"Você viu-me a agredir alguém? Eu não agredi ninguém, ca***ho" - Paulinho Santos


Futeblog Total
Blog reflexivo sobre o fenómeno futebolístico desde o seu (dele, futebol) dealbar até aos dias de hoje.