7.7.03

BERLUSCONI & A PROLIFERAÇÃO DOS BÊS

Por Cândido Sarmento *

A imprensa desportiva tem como primeira página o pilar dos escândalos futebolísticos internacionais: Silvio Berlusconi, colocando em segundo plano as mediáticas manchetes que são um quase exclusivo de Beckham... -Atentem à proliferação dos "Bês": Berlusconi, Barroso, Bush, Blair,Bibi, Big Brother.. - O certo é que o número 10 da Squadra Azurra terá que ser mais uma vez criticado, pelo lance que protagonizou e que colocou a Itália em desvantagem, frente a uma Alemanha que cada vez mais se consolida como selecção sólida e de mérito indiscutível.
A jogada caricata, dá-se neste jogo de fase de apuramento para o Euro2004, que se jogou em Estrasburgo na passada quarta-feira, num estádio repleto de jornalistas confiantes de polémica e de um publico italiano desmoralizado e mais confiante em amuletos que nos jogadores.
A sorte não beneficiou a equipa italiana que saiu com a bola no minuto inicial, já que o rodopiar da moeda de 2 Euros (brilhante, por usar, e de coroa francesa) lançada pelo árbitro desse mesmo país, deu vantagem aos jogadores Alemães que optaram jogar atacando para Este, quando se sabia que a Oeste o sol brilhava de forma incomoda e pouco usual para aquela latitude. Simone atrasou como ditam as regras a bola para o seu companheiro Luca, a seu lado no grande círculo. Uma frente de 3 médios Alemães correu para este jogador num arranque temível, soltando urros ameaçadores, lembrando uma guerra tribal, ao mesmo tempo que demonstravam uma potência em corrida ao melhor estilo Carl Lewis em disparo para um salto em comprimento. Luca, incapaz de dissimular o medo, aflito e com o nervosismo a coordenar-lhe os pés, decidiu atrasar mais uma vez, colocando a bola nos pés de Berlusconi, que circulava algo perdido perto dos limites da sua grande área. Berlusconi cujo seu lugar na equipa foi comprado pelo seu próprio dinheiro, é um jogador a que todos evitam passar a bola, fazendo-o apenas em jogos amigáveis, ou se a Italia logra de vasta vantagem sobre o adversário. É escusado recordar que Il Cavaliere se tornou Seleccionador/Jogador da selecção Italiana, quando no passado 2001 injectou vários milhões das antigas Liras para a remodelação do desporto italiano, a troco destes dois lugares de destaque no futebol italiano. Este feito inédito, faz de Berlusconi um elemento tão extravagante como prejudicial para o futebol e para o desporto em geral.
O certo é que essa corrida despreocupada que realizava (qual jogador por programar do Match Day do Spectrum), ilustrava o quão inesperado era para o jogador que lhe fosse passada a bola nos minutos iniciais do jogo. Assim, ao deparar-se na posse do esférico, e com os germânicos ainda mais convictos rumo a si, Berlusconi concretizou o golo que prometeu quando assumiu o cargo de jogador, no entanto, na baliza errada. Tendo a intenção de cortar para canto, falha num primeiro intento a bola, o chuto no vazio provoca um desequilíbrio parcial do corpo do sessentão bronzeado, houve ainda tempo para um sorriso de descontracção,como dizendo "Tutto sotto controle!", e é então que a caneleira direita (e não a chuteira) acertam na bola, numa trajectória tão ilusória, que o guardião italiano, que corria para o jogador, apenas pôde confirmar que a extensão do seu braço era inferior à distancia à bola, e que esta já tinha entrado dentro do rectângulo que defendia.
Berlusconi que em nenhum momento se envergonhou, citou numa entrevista para a RAI que sugeriu ao árbitro que fosse recomeçada a partida argumentando não ter ouvido o apito inicial. Por outro lado, culpando os franceses, recomendou que se observasse nas imagens o mau estado do terreno, pieno di buchi ed elevazzione, coautores da trajectória da bola. Também se dirigiu ao guardião do AC Milan com desdém, e é já certo que Paolo Giovanni está proibido de pisar o San Siro (à semelhança do castigo, com outra escala, imposto ao coreano que não poderá voltar a pisar Itália).
A falta de água quente nos balneários ao intervalo levaram a que não se recomeçasse o jogo na segunda parte, tendo sido adiados os 45 minutos finais para a quarta-feira da próxima semana.
O jogo que ao encerrar a primeira parte se mantinha com o marcador a 1-0, foi um espectáculo polémico marcado pela ausência de teor futebolístico na verdadeira acepção do termo. As estrelas italianas escolhidas por Berlusconi, quase todas pertencentes ao AC Milan, equipa de que também é presidente (mas em que felizmente não joga), apareceram nervosas e condicionadas por terem em campo consigo, o seu próprio seleccionador e presidente. A equipa alemã também correspondeu com um péssimo futebol, talvez afectada pelos rumores que saíram no Die Futväalda semana passada, em que se referia que Berlusconi qual Padrinho, tinha encomendado represálias horrendas para os autores dos golos da equipa alemã, e nem mesmo um siciliano (autor destas declarações) com supostas ligações anteriores à mafia se achou capaz de executar tais atrocidades
em atletas de alta competição.
Certo é que ainda por explicar está a sabotagem ao aquecimento dos balneários, e se por um lado, no precipitado do momento, se levantaram dúvidas quanto à legitimidade em terminar a partida, por outro lado a possibilidade de uma sabotagem nas condutas de gás com vista a uma explosão do recinto foi razão suficiente para que todo o estádio fosse evacuado pelos gendarmes franceses (parece certo que o terrorismo terá chegado ao futebol).
As investigações decorrem enquanto que a generalidade das pessoas mais uma vez esquecerá em dias, este episódio controverso do quotidiano desportivo, apoiados por uns Media sempre dispostos a iludir com notícias sensacionalistas. Parece não haver armas para combater os que com mérito duvidoso se instalam no poder.

*Candido Sarmento é professor de natação no C.N. Raval em Barcelona,
escreve semanalmente no 'Mundo Deportivo'.