26.5.05


O Eterno Retorno e três dos seus grandes percursores: Nietszche, Jorge e Gonçalves, respectivamente Friederich, Artur e Horácio.


BREVE CONTRIBUTO PARA A COMPREENSÃO FENOMENOLÓGICA DO ETERNO RETORNO NA PÓS MODERNIDADE PRÁTICA DO FUTEBOL PORTUGUÊS
ou
ASSIM JOGAVA ZARATUSTRA
ou mesmo até
COM TITULOS GIGANTESCOS COMO O PRIMEIRO E TROCADILHANTES COMO O SEGUNDO, ESTE OPÚSCULO ANTOLHA-SE MAGISTRAL E INDISPENSÁVEL PARA A NOSSA GERAÇÃO E PARA AS GERAÇÕES VINDOURAS.

Pelo Professor Quarlos Eirós.

"L'éternel retour est une idée mystérieuse et, avec elle, Nietzsche a mis bien des philosophes dans l'embarras : penser qu'un jour tout se répétera comme nous l'avons déjà vécu et que même cette répétition se répétera encore indéfiniment!" Assim começa este texto com a solenidade que só as introduções em estrangeiro sabem conferir a pequenas, médias e grandes dissertações, dotando estas linhas do estatuto de grande opúsculo de inegável calibre intelectual. Assim começa, igualmente, o grande romance de Milan Kundera, L'Insoutenable Légèreté de l'Être, com um passe em profundidade para a ideia de Eterno Retorno, originária da Grécia antiga e desenvolvida por Freddie Nietszche, filósofo bigodal com grandes parecenças com Artur Jorge, treinador bigodal também ele com grandes semelhanças com o filósofo alemão.
Para Friederich Nietszche, a ideia de Eterno Retorno traduz-se na representação do futuro, concebido simultaneamente como afirmação e repetição da vida já vivida. Perguntará o leitor mais incauto em que moldes se relacionará esta ideia de temporalidade e eternidade com a pós modernidade do futebol? O mais céptico dos respondentes à pergunta acima enunciada poderá falar de mais uma Impostura Intelectual na esteira conceptual de Alan Sokal e Jean Bricmont. Todavia, escassos milissegundos de reflexão são suficientes para levar qualquer pessoa minimamente atenta à conclusão que uma boa parte do fenómeno da pós modernidade no futebol gira em torno da ideia de Eterno Retorno.
Para chegar até ao âmago do Eterno Retorno no futebol, temos que mergulhar na ideia de Heidegger (adepto do 1.FC Köln), para quem o método de Nietzsche (fanático do Bayer Uerdingen) é um "método de conversão", que aposta forte na crítica da separação entre "mundo do futebol verdadeiro" e "mundo do futebol aparente", tal como a escola sul americana distingue o 4-4-2 normal e o 4-4-2 double volante. A partir daí, a "conversão" atinge o plano da moral, para desmentir a igualdade entre razão, virtude, posse de bola e felicidade anunciada por Sócrates, afirmando, opostamente, que a virtude é consequência do futebol arte - que traz felicidade - para denunciar a limitação patológica do moralismo da filosofia grega de Otto Rehagel. Ou seja, não há mundo real nem mundo aparente. Há mundo do futebol e ponto final. O pensamento do eterno retorno entra, precisamente, neste ponto: numa concepção unitária e totalizante do mundo do futebol, transcrevendo-se como "a confirmação da imanência após a morte de Deus", sendo que, em linguagem futebolística, a morte de Deus é a morte do futebol arte, ocorrida numa quente tarde em Sevilha, no ano de 1982. Ou seja, se o futebol arte retornar, há-de morrer outra vez em Sevilha.
Contudo, a análise opuscular aqui levada a cabo foge destes cânones formais, demasiado impregnados de academismo nefelibata, e penetra, qual diagonal de José Dominguez, na subcategoria formal de "os agentes do futebol pós moderno e a ideia de Eterno Retorno". Aqui dentro, é fácil destrinçar aqueles que leram Nietszche e todos aqueles outros que não foram além de Feuerbach.
É, obviamente, dentro desta categoria – os agentes da pós modernidade que leram Nietszche – que o fenómeno do Eterno Retorno é mais palpável e, sobretudo, mais pós moderno. E vários são os casos de Eterno Retorno no nosso futebol, aqui se apresentando aqueles considerados pela exegese como os mais flagrantes.
Antes de todos, detemo-nos no Eterno Retorno de Horácio Gonçalves ao Varzim. Já se perdeu a conta ao número de vezes em que este treinador foi chicoteado psicologicamente, andou por outros lados e voltou ao convívio dos Lobos do Mar. Eis-nos perante um caso em que, um dia, tudo se repete, relegando para a segunda de honra a mítica ideia de Heraclito, segundo a qual a mesma água não passa por baixo da mesma ponte duas vezes. Como é lógico, Heraclito nunca se deu ao trabalho de ler Nietszche ou mesmo até Milan Kundera.
Outros exemplos flagrantes são os do Eterno Retorno do lendário professor Neca ao Desportivo das Aves, de Joaquim Teixeira e Fernando Festas ao Leça, de Carlos Brito ao Rio Ave, de Ivic ao Porto e ao Benfica, de Marinho Peres a Guimarães, de Juca ao Sporting. Todos denunciam que grande parte dos dirigentes desportivos portugueses não conseguem viver sem o Assim Falava Zaratustra na sua cabeceira.
Situemo-nos, agora, dentro da asserção do filósofo alemão que nos diz que “A ideia do Eterno Retorno é a fórmula suprema da afirmação” (Ecce Homo). Não será difícil pensar em Rui Costa e no seu Eterno Retorno ao Benfica. Não será estranho pensarmos na consumação do Eterno Retorno na pessoa de Jaime Pacheco e na prazenteira cidade de Guimarães. Não será descabido começarmos a formular a teoria do Eterno Retorno de José António Camacho ao Benfica, de Luís Figo ao Sporting, ou, até em círculos mais restritos, do F.C. Porto aos Eternos Retornos, já consumados, de Hélder Postiga e Vítor Manuel Martins Baía. Todos estes casos se clarificam ao som de History Repeats Itself, cantado por Jane Siberry.
Casos de análise e categorização mais difícil aparecem quando falamos de Roberto Deus Severo, vulgo Beto, e o Eterno Retorno da sua ida para o Real Madrid. Aliás, em 2005 cumpre-se o primeiro de nove anos em que tal tema não é focado pela imprensa e alimentado pelo silêncio expectante do central leonino. Outro case study, este sim, de amplitude académica magnânime é o Eterno Retorno das equipas de Luís Campos à segunda divisão. Há, aqui, uma força oculta, um magnetismo qualquer que explica o risco que corre qualquer plantel treinado pelo José Mourinho de Fão.
Em conclusão, é fácil encontrarmos uma concepção nietszchiana no futebol português, muito à frente daquela do treinador de bigode que falava em fazer coisas bonitas. Basta atentar no número de casos de Eterno Retorno aqui plasmados, no conceito de Super Homem aplicado a cada reforço de cada plantel e no espírito dionisíaco que preside à origem de um processo judicial em curso. É que convém não esquecer que Freddie Nitszsche é um dos pais da pós modernidade. A julgar pelo bigode, só pode ser um grande pai e um super pós moderno.