10.12.03


Carlos "A Locomotiva do Barreiro" Manuel:
o autor da charutada de Estugarda.

O Milagre da Qualificação (2 - México 86)
por Augusto Justo, mentecapto

Tempos conturbados e conturbantes eram os que se viviam na Selecção Nacional, naquele outono inesquecível de 1985. Depois de um brilhante terceiro lugar no Euro Cátrevancátre, nas terras de de Gaulle, muito era demandado à equipa das Quinas, como se a partir de então, a qualificação passasse a ser regra e a campanha medíocre passasse a ser excepção. José Torres (o Bom Gigante) assumira o comando da equipa e o desgoverno de uma fase de qualificação abaixo das expectativas: derrotas lendárias com a Suécia em casa e com a saudosa Checoslováquia (que saudades de escrever este nome) fora, faziam com que tudo, mas mesmo tudo, estivesse dependente de um deslize da Suécia em Praga e de uma quase onírica vitória lusa na Alemanha. A missão era impossível, excepto no plano matemático, como sempre. Mais uma vez, essa ciência lógica tão bem sabida por Pedro Nunes, servia o futebol da sua (dele, Pedro) mátria. Triste fado luso, una volta più. À saída para Estugarda, Torres proferia uma das mais místicas frases de sempre: quando questionado sobre se teria mais hipóteses de ganhar fora à RFA do que um camelo passar pelo buraco da agulha, Torres, bíblico, ofereceu ao mundo o imortal grito de "deixem-me sonhar". E assim foi. Deus quer, o Torres sonha e a obra nasce. Naquela fria noite de 16 de Outubro de 1985, no Neckarstadium, o milagre das quinas aconteceu. Carlos Manuel Correia dos Santos, a Locomotiva do Barreiro, tem a bola nos pés e corre. O minuto é o quinquagésimo quarto, o resultado está a zero. Carlão avança e chega a um ponto de ruptura cósmica: um misto de impotência, esgotamento, raiva e cólera faz com que o camisa seis mande uma charutada rumo à baliza do lendário Tony Schumacher. A bola avança sem parar, Carlão, exausto e talvez até farto de ser português, olha a trajectória do esférico. E a bola entra. E o guarda redes da Mannschaft nem queria acreditar. Golo de Portugal, gritava Rui Tovar, secamente. Carlos Manuel como que é atingido por um relâmpago e corre e feseja e pula e urra de braços abertos. Depois... depois foi o ferrolho total. O anti jogo, o queima tempo, o alivia Venâncio e o chuta para fora. E por fim, a vitória com a ajuda da maldita matemática: a Suécia perde com a Checoslováquia e Portugal, quase sem saber como, apura-se para o Mundial do México. Torres é um homem comovido. O país está incrédulo. Mas as núvens negras do descontentamento começavam a deslocar-se para Saltillo.
Sob a arbiragem do Senhor Hacket, e perante 55.000 boquiabertos alemães ocidentais, as equipas alinharam com:
RFA: Schumacher, D. Jakobs (46. Gründel), Thomas Berthold, Karlheinz Förster, Andreas Brehme, Allgöwer, Herget, Meier, Peter Briegel, Pierre Littbarski (63. Thomas Allofs), Karlheinz Rummenigge.
Treinador: Franz Beckenbauer
Portugal: Bento, João Pinto, Frederico, Venâncio, Inácio, Carlos Manuel, Veloso, António Sousa, Jaime Pacheco, Fernando Gomes (José Rafael) e Manuel Fernandes.
Treinador: Zé Torres